Dança (SADIE, 1994, Dança)
As referências a tipos de dança começam a surgir em textos a partir do século XII, com títulos como CAROLE, hovetantz, ESTAMPIE e SALTARELLO; à exceção da carole (uma dança em fila, ou circular), pouco se sabe a respeito de seus aspectos musicais ou coreográficos. Os tipos de danças mais formais, processionais, levaram à clássica BASSE DANSE borgonhesa e à mais elaborada bassadanza italiana, no século XV, e daí para a PAVANA renascentista. A maior parte das peças instrumentais para dançar, deste período, é em seções breves e repetidas, cujo número vai de três a sete; às vezes são pares de danças, com a segunda de um par mais rápida do que a primeira, e em métricas diferentes. Nada se sabe com certeza, no entanto, sobre a relação dos passos de dança com a música que se conservou.

Com o século XV, surgem na itália as tradições de esino e teoria da dança, e os manuais de instrução associam música e coreografia. As danças de corte da época, como a CALATA e a striana, são conhecidas por seus nomes e por alguns aspectos mais destacados; um bom número de danças, como a MORESCA e o BRANLE, era considerado impróprio para um cavalheiro. Um novo repertório surgiu após 1500, com o uso de branles e morescas em todas as partes da Europa, para a dança popular em grupo e a dança profissional solista.

No período 1550-1630 a dança de corte é bem documentada e as fontes refletem a popularidade da dança, tanto social quanto teatral. A música vocal da época, apesar de não necessariamente destinada à dança, reflete os ritmos dos tipos de danças populares, como a GALHARDA, a CANÁRIA e a COURANTE. Tradicionalmente a dança, frequentemente em compasso ternário, simbolizava alegria e amor retribuído. Ao mesmo tempo, dança, canção e espetáculo, juntaram-se nas novas formas dramáticas, que incluem o intermedio, o ballet de cour e a masque, enquanto os ritmos de dança permeavam todo o desenvolvimento dos novos idiomas instrumentais do final do século XVI e início do XVII. Nas reuniões sociais, entre as danças incluíam-se a pavana, solene e processional, os branles circulares e danças em movimento progressivo para a frente; havia também danças coreografadas individualmente para pequenos grupos, e dança em mímica executadas por casais na posição de abraço, que ampliaram a relação entre a dança e o jogo de amor.

A dança teatral tinha um âmbito muito variado; incluíam procissões formais para dignitário, representações de batalhas, balés hípicos ou obras cênicas, às vezes com danças para solistas ou pequenos grupos (como Il ballo delle ingrate, de Monteverdi). Podiam ser também danças organizadas geometricamente para grupos grandes, tais como os que compunham os momentos principais do intermedio, do ballet de cour e da masque, que persitiram por todo o século XVII. Os manuais de dança do período fornecem numerosas coreografias específicas para danças de salão, i,e. sociais, em particular Il ballarino (1581) e Nobiltà di dame (1600), de Fabritio Caroso, Orchésoggraphie (1588), de Thoinot Arbeau, e Le gratie d'amore (1602), de Cesare Negri. A Itália dominou a dança no século XVI, e os maîtres italianos tinham trabalho em todas as partes da Europa. As coreografias de palco remanescentes deixam claro que as danças cênicas para grupos eram versões elaboradas das danças de salão da época; nestas, diferentes tipos de movimentos desfilavam em rápida sucessão, com números variável de dançarinos. Fica claro também que a dança popular alimentou, em certa medida, a dança de corte.

A música para dançar podia provir de qualquer tipo de instrumento, mas na Itália cada tipo de instrumento estava associado a um tipo particular de cena ou personagem: tambores e instrumentos de palheta dupla eram usados para camponeses, por exemplo. Um bom número de música de dança desse período, especialmente na Itália, é construído sobre bassos ostinatos e outros padrões de variação. Os pricipais tipos usados eram a ALLEMANDE, o branle, a courante, a galharda, o PASSAMEZZO, a pavana e o saltarello; havia tipos locais, como adump inglesa, e outros, populares - incluindo a CHACONA e a SARABANDA -, que eram considerados muito rudes ou lascivos para o uso cortesão. O padrão já referido de pares de danças, com uma dança lenta binária seguida por uma rápida ternária (como os pares pavana-garlhada ou passamezzo-saltarello), é o comum nas fontes musicais.

A partir de c.1630 a influência francesa tornou-se mais forte no norte da Europa, enquanto a influência italiana persistia no sul. Havia uma multiplicidade de tipos de dança: a sarabanda e a chacona tornaram-se aceitáveis, a courante se desenvolveu e o minueto destacou-se. Os espetáculos de dança franceses cresceram em números e em escala, culminando nas danças teatrais das óperas de Lully, e no gênero muito em voga no início do século XVII e durante a Regência, a opéra-ballet, consistindo de uma série de divertissements em que a dança tinha papel de destaque. Encontra-se um paralelo inglês na utilização da dança nas simi-óperas de Purcell; na ópera italiana, a dança só era utilizada, em geral, nas cenas finais, apesar de que em certos entretenimentos teatrais da corte havia dança entre os atos, com música habitualmente fornecida por compositores especializados.

O estilo da dança mudou de forma marcante no século XVII, apesar da documentação ser fraca até a publicação do English Dancing Master, de Playford (1651, muitas edições até 1728), que trata basicamente da COUNTRY DANCE inglesa. No final do século XVII, entre as danças mais praticadas incluíam-se a allemande, o branle, a BOURRÉE, a canária, a chacona, a country dance, a courante, a FURLANA, a GIGA, a LOURE, o MINUETO, a PASSACAGLIA, o PASSAPIED, o RIGODON e a sarabanda. Na dança social, como na teatral, esses tipos costumavam ser agrupados em suítes cada vez mais padronizadas. Na Alemanha floresceu a suíte para conjunto instrumental com Schein, Peuerl, Kriegere Georg Muffat, e a suíte para cravo, com Froberger, Kuhnau e, mais tarde, Bach. Na frança, as danças para teclado foram agrupadas por Chambonnières, os Couperin e D'Anglebert, mas a suíte autêntica só surgiu mais tarde, naquele século. Entre os compositores ingleses de grupo de danças incluem-se Jenkins, Locke e Purcell. As coletânias italianas de danças classificam-se como grupamentos no estilo suíte, ou sonatas do tipo sonata da camera, de compositores como Buonamente, Marini e, mais tarde, G.B. Vitali e Corelli.

No início do século XVIII, o predomínio francês na dança teatral era amplamente reconhecido: além de ser decorativa, passou a desempenhar um papel no drama. Esse precesso já havia sido iniciado por Lully e continuou, em certa medida, nas opéras-ballets de Campra. As duas dançarinas francesas mais influentes do início do século XVII foram Marie-Anne Camargo (1710-70), famosa por sua técnica virtuosística, e Marie Sallé (1707-56), astista mais criativa em sua espressão da emoção; ambas envolveram-se na simplificação dos figurinos de dança, da formalidade da era anterior para uma crescente mobilidade. A Camargo desempenhou um papel proeminente nos balés de Rameau, o mais inventivo compositor para danças teatrais do início do século XVII.

O principal reformador da dança, no entanto, foi Jean-Georges Noverre (1727-1810), influenciado por Sallé, Rameau e pelo ator inglês David Garrick. Ele cristalizou a visão do ballet en action (ou ballet d'action) como música, drama, coreografia e encenação, tudo isso subordinado a um plano geral, e exigiu o fim do virtuosismo pelo virtuosismo, bem como dos figurinos esteriotipados e pouco práticos. Trabalhou com Jommeli e, em Viena, com Gluck. Outros importantes coreógrafos desse período foram Franz Hilverding van Wewen (1710-68), importante maître de ballet vienense, que criou balés em pantomina com desenvolvimento completo, alguns deles trágicos, em vez dos divertissements decorativos; também trabalhou na corte russa com um compositor para balés, Starzer, que mais tarde copôs em Viena para Noverre e seu rival Gaspero Angiolini (1731-1803). Angiolini colaborou com Gluck em suas obras "reformadoras", o balé Don Juan (1761) e a ópera Orfeo ed Euridice (1762).

Análogo à evolução da ópera nessa época, um novo tipo de balé, baseado numa visão de classe média da vida camponesa, foi desenvolvida por Jean Dauberval (1742-1806), com La fille mal gardée (1789). Outra evolução ocorreu em Londres, com um balé de Charles Louis Didelot (1767-1837), aluno de Noverre, utilizando máquinas que permitiam aos bailarinos "voar" presos por arames.

A dança de salão do final do século XVIII centrava-se no minueto, a dança mais importante no divertimento aristocrático (e também na sinfonia e no quarteto de cordas), usada como símbolo da dança aristocrática no Don Giovanni, de Mozart. Nele, o minueto entra em contraste com a CONTREDANSE (do inglês countrydance) burguesa, habitualmente em compasso binário, que mais tarde evoluiu para formas diferentes (ANGLAISE, ECOSSAISE, COTILLON e, mais tarde, REEL), e era dançada ao comprido no salão. Na dança de salão da classe média, vários tipos de dança em roda foram desenvolvidos para casais dançarem enlaçados; o que culminou na VALSA, que ao que tudo indica evoluiu das assim chamadas danças alemãs, como o DEUTSCHE e o LANDLER. Foram introduzidas nos salões de dança c.1760. Viena era o centro da dança alemã e da valsa. Mozart e Beethoven, mais tarde, produziram-nas em quantidades para os bailes da corte, tal como fez Schubert para a dança burguesa. A valsa foi taxada de lasciva e imoral, mas isso não a impediu de se difundir (muito pelo contrário). Além do minueto, outras danças eram usadas na música erudita, especialmente, em meados do século XVIII, a POLONAISE, por compositores como W.F. Bach e Telemann, ao mesmo tempo em que os ritmos de outras ocupavam uma posição importante tanto na música vocal quanto instrumental, emprestando a uma peça suas associações expressivas particulares (tal como o pathos da Siciliana, em A. Scarlatti e Haendel, e de fato até Mozart).

A principal evolução no século XIX foi o surgimento do balé romântico, um ballet en action baseado na dança mímica expressiva e no uso dramático de um corps de ballet; foi influente nesse sentido um discípulo de Dauberval, Salvatore Viganò (1769-1821), coreógrafo do balé de Beethoven sobre Prometeu. A maioria dos balés (As criaturas de Prometeu é uma exceção) era uma montagem feita pelos músicos de teatro, de acordo com as exigências de um coreógrafo. Essa tradição desenvolveu-se particularmente em Paris, de forma especial com Hérold, cuja partitura para La fille mal gardée (1828) ainda é executada, e Halévy, cuja Manon Lescaut (1830) usava a melodia para a identificação dos personagens. A técnica de dança da época dava ênfase à leveza, graça e modéstia, com o uso de sapatilhas de ponta para efeito artístico. Esse estilo foi inaugurado por La sylphide (1832, Paris), com Marie Taglioni (1804-84), cuja dança refletia o primeiro espírito romântico. Seu estilo contrastava com o da vienense Fanny Elssler (1810-84), notável por seu forte caráter dramático e por sua técnica virtuosística. Outra bailarina importante foi Carlotta Grisi (1819-99), que inspirou a Giselle, de Adams (1841, Paris), um ápice do balé romântico. Esses artistas fizeram de Lodres um importante centro de balé nos anos 1840; importantes foram também Copenhagen e a Rússia, como continuam sendo até hoje.

Dentro da ópera, o balé conservou sua posição totalmente secundária, servindo basicamente a uma função decorativa durante boa parte do século XIX, apesar das óperas de Glinka não serem as únicas a utilizá-lo em cenas que brotam da ação, incorporando a dança folclórica a fins dramáticos. Meyerbeer também utilizou a dança em forma dramática em Robert le diable, mas na maioria de suas óperas ela é apenas ornamental. Os balés operísticos de Verdi, quase sempre um acréscimo para as produções de Paris, fazem algumas tentativas simbólicas de integração ao drama, o mesmo que fez Wagner para a produção de Tannhauser Paris, onde a inclusão do balé era um pré-requisito tradicional.

O balé clássico, apesar de influenciado pela obra de Delibes em Paris (Coppélia, 1870; Sylvia, 1876), foi principalmente obra de Tchaikovsky, em Moscou, com O lago dos cisnes (1877), A bela adormecida (1890) e O quebra-nozes (1892), A bela adormecida foi coreografado pelo maître de ballet francês Marius Petipa (1818-1910), diretor de Balé Imperial Russo, o qual criou 46 balés que alçaram esse estilo a um auge de grandiosidade espetacular. Ele planejou detalhadamente a sequência de danças, o que deu a Tchaikovsky a ajuda objetiva de que precisava. Também teve algum envolvimento nos outros dois, e em balés de Glazunov (As estações, 1900) e Minkus (Raymonda, 1898). Outro grande coreógrafo russo foi Lev Ivanov (1834-1901), que trabalhou em O quebra-nozes e nas Danças polovitsianas para a ópera Principe Igor (1890), de Borodin.

Na dança de salão, no entanto, Viena manteve a precedência graças ao predomínio da valsa. Outras danças importantes foram a QUADRILHA, mais complicada, e o GALOPE, muito animado e muito mais simples. A POLCA, da Boêmia, também alcançou grande popularidade por volta de meados do século, o mesmo acontecendo com o SCHOTTISCHE. A quadrilha se ajustava a padrões regulares de oito compassos, mas outras formas davam ensejo a uma evolução maior, especialmente a valsa, com sua introdução extensa e suas oportunidades para recapitulação e expansão melódica. A família Strauss, em viena, foi seu maios expoente. A valsa foi uma da danças que, em forma estilizada, serviu a composição para piano, como as de Chopin e Brahms. Chopin também valeu-se dos ritmos de danças de sua Polônia natal, como a MAZURCA e a polonaise. Smetana e Dvorák, igualmente, usaram formas nacionais de dança, como a FURIANT e a DUMKA.

A personalidade central da dança cênica no início do século XX foi Sergei Diaghilev (1872-1929), cujo gênio mudou a face e o destino da dança clássica, e determinou seu rumo, mesmo não sendo ele coreógrafo nem compositor. Sua companhia Ballets Russes, que se apresentou pela primeira vez em Paris em 1909, utilizava música de três formas diferentes: uma antologia de obras de um compositor (p.ex., a coletânea de peças de Chopin, que ele reuniu para Les sylphides, ou das peças "de Pergolesi" que Stravinsky reuniu para Pulcinella); uma miscelânea de obras de compositores diferentes; ou o uso de uma obra já existente para a criação de um balé bastante diverso das intenções do compositor. Mas também manteve o hábito de encomendar música nova, criando assim o repertório básico do balé moderno: O pássaro de fogo, Petruchka e A sagração da primavera, de Stravinsky, Jeux , de Debussy, Daphnis et Chloé, de Ravel, El sombrero de tres picos, de Falla, e Les biches, de Poulenc, são alguns exemplos. Utilizou o trabalho de coreógrafos como Fokine, Massine e Balanchine; Picasso e Cocteau foram alguns de seus cenógrafos. Ele formou as principais figuras do balé britânico, tal como fez Balanchine com os grandes nomes em Nova York. Na Russia, a tradição clássica foi preservada e cultivada na era soviética, com a criação de novos balés por Glière (A papoula vermelha, 1927) e Shostakovich (A idade de ouro, 1930), bem como Prokofiev (Romeu e Julieta, 1940; Cinderela, 1945). Particularmente nos EUA, a dança clássica foi posta em xeque pela dança "moderna", cuja pioneira foi Isadora Duncan (18778-1927), que usou a arte grega antiga como inspiração para seu estilo livre de dança (com qualquer música que lhe despertasse a imaginação), bem como Ruth St. Denis (1877-1968), que inspirou-se em fontes orientais e formou toda uma nova geração de bailarinos norte-americanos, especialmente Martha Graham (1900-1990). Um aluno de Graham, Merce Cunningham (n1915), colaborou com John Cage, ambos sendo pioneiros numa dissociação entre a música e a dança, em que cada qual procurava a autossuficiência.

Se a dança social no século XIX teve origens na Europa e viajou para a América, a mão foi invertida no século XX. Um antecedente disso foi o BOSTON (ou valse boston), no final do século XIX; seguiu-se o TANGO, imediatamente antes da I Guerra Mundial, junto com danças de regtime, como o TWO-STEP e CAKEWALK, e (após a I Guerra Mundial) o CHARLESTON e o FOXTROT. Nos anos 30, cresceu o interesse pela dança latino-americana, ao som de bandas que incluíam maracas, claves e bongôs; a RUMBA, o SAMBA e o tango foram os mais populares. A era do SWING, dos anos 30, assistiu à evolução de danças mais livres, como o JITTERBUG. Nos anos 40 e 50, enquanto os estilos pop e cool transformavam o jazz de música de dança em música de concerto, as bandas latino-americanas popularizaram as danças do Caribe e da América Latina, incluindo o CHA CHA CHA; no final dos anos 50, as danças negras associadas ao rhythm-and-blues, e mais tarde ao rock and roll, ganharam a preferência. Algumas danças de rock, como o TWIST, eram variantes de danças de ragtime, mas sua execução dependia menos da interação dos parceiros do que do indivíduo como parte de um grupo. Nos anos 70 e 80, a batida contínua e instigante da música de rock, funk e soul, em guitarras, metais e bateria, que ameaçam sobrepujar a melodia, fez surgir um conceito de dança frenética - ao fluxo constante de som, os dançarinos podem criar quaisquer movimentos de dança, em sequências de sua própria escolha.

REFERÊNCIA
SADIE, S. Dicionário Grove de Música. Tradução de Eduardo Francisco Alves. Rio de Janeiro : Zahar, 1994. 1060 p.

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